
Vayeshev
O segredo dos sofrimentos
Nossa Parashá nos conta sobre os sofrimentos do nosso terceiro patriarca, Yaakov. Mesmo sendo Yaakov o maior dos três patriarcas, ele foi o que mais sofreu.
A Guemará nos conta que se alguém é um Tzadik completo, ou seja, estuda Torá e cumpre os Mandamentos Divinos, Hashem (D’us) dá para ele uma vida muito boa nesse mundo e um grande Paraíso no próximo mundo.
A Guemará também nos conta que um Tzadik que é filho de um Tzadik tem uma vida muito boa nesse mundo e o Paraíso garantido.
Pergunta o Zohar, como pode ser que Yaakov que foi o principal dos nossos três patriarcas, que também estava em um nível de Tzadik perfeito e também era um Tzadik, filho de Tzadik e neto de Tzadik, passou por terríveis sofrimentos durante 130 anos da sua vida contradizendo tudo o foi dito anteriormente ?
Quando Yaakov chegou ao Egito, o faraó perguntou a ele qual era a sua idade. Yaakov sabia que o faraó recebia antecipadamente todas as informações sobre aqueles que iriam se encontrar com ele, o faraó sabia que Yaakov tinha 130 anos.
Então porque fez à ele essa pergunta? Porque as informações não batiam, Yaakov aparentava ser muito mais velho do que realmente era. Pela resposta de Yaakov vemos que ele entendeu certinho o que o faraó estava perguntando.
Naquela época, há mais de 3.500 anos atrás, as pessoas eram muito fortes, e às vezes tinham uma vida excepcionalmente longa, e esse era o caso do próprio faraó. Pela cara de Yaakov, o faraó pensou que ele era nosso primeiro patriarca, Avraham.
Yaakov justificou o espanto do faraó com a seguinte resposta:- “Os dias da minha vida foram poucos e ruins, e não alcançaram os dias de vida de meus pais”.
Ou seja, Yaakov justificou o porquê de sua aparência não ser compatível com a sua idade em relação a sua época.
A resposta de Yaakov para o faraó foi que os dias da sua vida, mesmo tendo sido poucos relativos à sua época, foram ruins, e por isso ele aparentava ser muito mais velho do que realmente era.
Ou seja, o próprio Yaakov concordou que sofreu 130 anos até aquele momento da sua vida.
Sendo que Hashem (D’us) é a essência do bem e a natureza do bem é fazer o bem, como pode ser que Yaakov, que de acordo com a própria Torá deveria ter vivido uma vida extremamente boa, foi a pessoa que mais sofreu?
O Zohar nos traz algumas possibilidades que justificam o fato de uma pessoa boa ter uma vida ruim.
Sofrimentos de amor
A Guemará nos conta que quando alguém está sofrendo, a primeira coisa que deve fazer é um check-up espiritual.
Verificar se está fazendo alguma coisa errada que justifique esses sofrimentos e voltar para o caminho certo. Deixar de fazer coisas ruins e se arrepender de tê-las feito.
Se mesmo assim os sofrimentos continuarem, essa pessoa deve acrescentar no estudo da Torá, porque talvez esteja fazendo alguma coisa errada sem saber, ou está em falta com o próprio estudo da Torá.
Diz a Guemará que se depois disso os sofrimentos ainda continuarem, saiba que eles são sofrimentos de amor.
Sofrimentos que não são ligados a coisas erradas que fizemos e que não são uma retificação para as nossas transgressões sendo que elas já foram retificadas.
A corrida de obstáculos
Nossa vida é uma corrida de obstáculos. Quando entramos nesse mundo estamos entrando nessa corrida, e de acordo com a intensidade dos obstáculos, assim será a grandeza da vitória e a recompensa por termos vencido.
Diz o Zohar que por causa do grande amor que Hashem tem por cada um de nós, ele nos dá uma vida mais difícil.
Ou seja, aumenta o tamanho dos obstáculos que temos que ultrapassar para que a nossa recompensa por ultrapassá-los seja muito maior.
E por isso esses sofrimentos são chamados de “sofrimentos de amor”, sendo que o único objetivo dessa categoria de sofrimentos é a de recebermos uma recompensa muito maior no próximo mundo.
Às vezes o motivo desses sofrimentos de amor é para nos refinar.
Quando nascemos, a primeira alma que se revela em nosso corpo é a nossa alma animal. Um óvulo só é fecundado se Hashem colocar nele essa alma animal, e assim começa a vida.
Nós próprios somos a Alma Divina, mas se a Alma Divina se revestisse diretamente no corpo, nosso corpo se desintegraria, sendo que o nível espiritual da Alma Divina e o do corpo são totalmente desproporcionais.
Para nossa Alma Divina se revestir no nosso corpo é necessário uma alma animal que é uma alma espiritual do nível mais baixo.
Esse nível mais baixo é o lado espiritual desse nosso mundo material chamado de mundo da Assiá.
A alma animal é a intermediária entre a Alma Divina que somos nós, e o nosso corpo.
A Alma Divina se encontra de maneira envolvente “Makif” desde que a alma animal se reveste no óvulo fecundado, e a partir disso ela vai se revestindo por etapas na alma animal e por meio dela no corpo.
Quando o menino faz treze anos ou a menina faz doze, nossa Alma Divina finalmente se reveste totalmente em nossa alma animal, que por sua vez está revestida no nosso corpo.
Nessa etapa nossa Alma Divina assume o controle deles, e assim nossa alma animal e nosso corpo se transformam em acessórios para nós que somos a Alma Divina.
Mas as vezes nossa alma animal está tão forte, que no lugar de ela se tornar nosso acessório e nossa vestimenta, nós é que nos tornamos o acessório dela.
Como uma pessoa que montou em um cavalo, e no lugar de o cavalo ir para onde essa pessoa quer conduzi-lo, o cavalo leva essa pessoa para o pasto e ainda obriga ela a ficar o dia inteiro cortando grama e trazendo para ele enquanto ele está deitado no pasto sem ter o que fazer.
A consequência disso é que nesse caso essa pessoa pode até ser um judeu religioso que estuda Torá e cumpre os Mandamentos Divinos, mas o comportamento dele lembra muito mais um animal que está mais interessado no pasto do que na Torá que estuda e nos Mandamentos Divinos que cumpre.
Deixando todos à sua volta intrigados com a contradição entre o que ele representa sendo um judeu religioso e a forma dele se comportar que lembra mais o comportamento animal do que o comportamento humano.
E para ajudar essa pessoa, diz o Zohar, pelo grande amor que D’us tem por ele, aumenta para ele a intensidade dos obstáculos da vida dela.
Devido aos sofrimentos, o lado animal dessa pessoa enfraquece, e consequentemente o lado espiritual dela se fortalece. Essa é uma categoria de sofrimentos de amor.
E por esse motivo, diz o Zohar, Unkelus traduziu o versículo em (Deuteronômio 7) “e paga seus inimigos, etc”. – Ele recompensa seus inimigos neste mundo pelas coisas boas que fazem para não receberem nenhuma recompensa no mundo de cima.
Daqui vemos que quando sofremos neste mundo somos chamados de “amados por Hashem”, o contrário do inimigo de Hashem que recebe uma vida boa nesse mundo como recompensa pelas coisas boas que fez, e não tem direito ao paraíso superior.
Tikun
Esses sofrimentos de amor às vezes estão ligados ao que fizemos na reencarnação anterior, e nesse caso o Tzadik filho de um Tzadik não é visto do ponto de vista biológico mas sim do ponto de vista espiritual.
Sua reencarnação anterior é chamada de “pai” da sua reencarnação atual mesmo que se trata da mesma pessoa.
Está escrito no segundo dos “Dez Mandamentos” que Hashem (D’us) cobra dos filhos a transgressão dos pais até a quarta geração.
Essa linguagem nos leva diretamente ao lado oculto da Torá, sendo que pela Torá os filhos não pagam pelas transgressões dos pais.
Sendo assim, esse versículo não está falando sobre a parte revelada da Torá, mas sim nos indicando o que se esconde por trás dela.
Diz o Zohar que nesse versículo a Torá está nos revelando a profundeza da bondade Divina.
Ou seja, como uma boa mãe que tem a obrigação de limpar seu filho que foi “nadar no esgoto”, assim também Hashem na sua enorme bondade nos limpa das “fezes espirituais” que grudaram na nossa Alma por causa das nossas más ações.
Mas D’us na sua infinita bondade nos dá três chances de retificarmos nossas transgressões de maneira positiva, e isso acontece por meio de três reencarnações.
Em cada uma dessas reencarnações somos chamados de filhos da nossa reencarnação anterior, e por isso a Torá usa a linguagem que Hashem “cobra dos filhos as transgressões dos pais”.
Não se trata de filhos biológicos, sendo que pela própria Torá o filho biológico não paga pela transgressão do pai, mas se trata de filhos espirituais.
Nossa segunda reencarnação é chamada de filho da nossa primeira reencarnação, e daí para diante.
O raciocínio que está por trás disso é de que aquele aspecto da Alma Divina que já se retificou, se separa da parte que ainda não se retificou, dando origem a uma nova Alma que é uma ramificação da Alma anterior e estará sempre ligada à ela como o filho estará sempre ligado ao pai.
E sendo que na ressurreição dos mortos elas ressuscitam como duas pessoas diferentes, elas são chamadas espiritualmente de pai e filho.
Sendo assim, a pessoa pode ser biologicamente filho de um Tzadik e neto de um Tzadik e mesmo assim ter uma vida ruim.
Porque o pai que é levado em conta nesse caso é a própria pessoa em uma reencarnação anterior.
Então por que eles são chamados de pai e filho?
Porque o aspecto daquela Alma que fez o bem, subiu para o paraíso, e o aspecto daquela Alma que está vinculado ao que precisa ser retificado nasce de novo, e agora é chamado de o filho da reencarnação anterior.
Uma Alma se ramifica em duas, e na ressurreição dos mortos elas vão ser duas pessoas.
A reencarnação anterior de Yaakov
Depois que Adam HaRishon, o primeiro homem, comeu a fruta do “etz hadaat”, ele acusou Hava, a primeira mulher, de tê-lo induzido a comer aquela fruta, e se separou dela por 130 anos.
O anjo da morte tem um aspecto feminino, tem uma esposa. Essa anja da morte chamada de Ly… que não falamos o nome dela para não atrair a coisa ruim, se materializava, e junto com outra demônia chamada de Na… tiveram relações conjugais com Adam HaRishon durante todos esses 130 anos.
Elas conseguiam se materializar para ter essas relações, engravidavam de Adam mas davam a luz à demônios.
Essas relações conjugais com as demônias afetaram o nível Neshamá de Adam, o nível mais alto da Alma Divina que ainda consegue se revestir no corpo.
Yaakov era a reencarnação do nível Neshamá de Adam, e por isso todos os sofrimentos dele foram ligados à assuntos familiares, medida por medida, para retificar o que fez Adam a Rishon.
Por isso Yaakov sofreu, e ele sabia que veio para esse mundo para fazer essa retificação.
Quando Yaakov contou para o faraó que seus anos foram 130, acrescentou que não chegaram aos anos de vida de seus pais.
Como Yaakov poderia afirmar que só viveria 130 anos e não chegaria a idade de seus pais? Porque ele sabia que veio para o mundo para retificar esses 130 anos que Adam se relacionou com as demônias.
Mesmo assim, D’us deu para ele 17 anos de vida a mais. E sendo que nesses 17 anos que recebeu de bônus ele não precisava retificar nada, Hashem deu para ele as revelações do Gan Éden aqui nesse mundo.
O mesmo acontece com cada um de nós. Sofremos somente pelo que fazemos errado conscientemente, e às vezes sofremos também por algo que fizemos conscientemente em uma reencarnação anterior.
Às vezes já retificamos a reencarnação anterior e também a atual, mas entramos na etapa dos sofrimentos de amor e achamos que ainda estamos na etapa retificação, e que a retificação está sendo desproporcional ao que fizemos.
Então vamos rezar forte para que já venha a Gueulá, nossa redenção final.
D’us vai tirar o espírito da impureza do mundo, o mal não vai mais existir e consequentemente ninguém mais vai sofrer.
No futuro esse nosso mundo vai se tornar mais alto Paraíso do que o Alto Paraíso, e esse futuro já está bem próximo de nós.
Rabino Gloiber
Sempre correndo mas sempre rezando por você
